Os 80 anos de Clara Nunes são festejados com discrição injusta diante do legado da cantora

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Homenagens estão concentradas em Caetanópolis, cidade natal da artista mineira projetada na década de 1970 como luminosa voz do samba após titubeante início de carreira. Clara Nunes (1942 – 1983), vista em foto de 1975, faria 80 anos nesta sexta-feira, 12 de agosto
Divulgação
♪ ANÁLISE – Se não tivesse saído precocemente de cena aos 40 anos, vítima fatal de complicações de aparentemente simples cirurgia de varizes, Clara Francisca Gonçalves (12 de agosto de 1942 – 2 de abril de 1983) poderia estar festejando hoje o 80º aniversário de vida.
Clara Francisca Gonçalves foi a luminosa cantora mineira imortalizada com o nome de Clara Nunes em discografia que, a partir de 1971, ganhou impulso e relevância.
Clara veio ao mundo no mesmo ano de 1942 que legou ao Brasil Caetano Veloso, Gilberto Gil, Milton Nascimento, Nara Leão (1942 – 1989), Nei Lopes, Paulinho da Viola e Tim Maia (1942 – 1998). Diferentemente destes grandes nomes, o 80º aniversário da cantora está sendo celebrado com injusta discrição pelo Brasil.
As únicas comemorações se concentram em Caetanópolis (MG), cidade natal da mineira – município que há 80 anos se chamava Cedro (MG) e era distrito de Paraopeba (MG).
Haverá a reabertura do museu Memorial Clara Nunes – com a inauguração da exposição Quando vim de Minas, batizada com o nome do samba do compositor Xangô da Mangueira (1923 – 2009) lançado por Clara em álbum de 1973 – e a realização da 17ª edição do Festival Cultural Clara Nunes, com programação que destaca show de Diogo Nogueira, filho de João Nogueira (1941 – 2000), parceiro de Paulo César Pinheiro na composição de vários sambas popularizados na voz de Clara.
Tais festejos são significativos, mas era preciso uma comemoração de âmbito nacional para fazer jus à dimensão do legado de Clara Nunes.
Mesmo sem ter nascido no mundo do samba, a cantora se converteu ao gênero com sinceridade a partir da bem-sucedida estratégia de marketing criada em 1971 pelo radialista e produtor musical Adelzon Alves para tentar dar a Clara a popularidade e o prestígio que a cantora vinha perseguindo em vão desde a segunda metade dos anos 1960, década em que a artista estreou na gravadora Odeon com o esquecível álbum A voz adorável de Clara Nunes (1966).
Houve lampejo de sucesso no segundo álbum, Você passa eu acho graça (1968), mas Clara somente encontrou um rumo e uma turma a partir do quarto álbum, Clara Nunes (1971), arquitetado por Adelzon.
A partir de então, a discografia da artista resultou impecável, com destaque para álbuns consagradores como Alvorecer (1974), Claridade (1975), Canto das três raças (1976), As forças da natureza (1977) e Guerreira (1978). Todos esses álbuns – assim como os posteriores Esperança (1979), Brasil mestiço (1980), Clara (1981) e o derradeiro Nação (1982) – resistem muito bem ao tempo.
E, se estes discos conservam em 2022 o viço da época dos respectivos lançamentos, é porque Clara aliou a luminosidade da voz a um repertório de qualidade atemporal, selecionado conjuntamente com Adelzon Alves e – a partir de 1976 – com Paulo César Pinheiro, produtor dos sete últimos álbuns da cantora.
Em que pese o titubeante início de carreira, Clara Nunes marcou época na música brasileira ao longo dos anos 1970, atingindo vendas expressivas para o mercado fonográfico brasileiro a partir do álbum Alvorecer (1974), disco em que aparece na capa com a imagem estilizada de baiana que sublinhou a afro-brasilidade entranhada no repertório da cantora.
Mais lembrada nos 70 anos do que nos 80, Clara Nunes reluz na música do Brasil como uma voz de ouro do ABC do samba sem ter se restringido ao gênero. Outros ritmos do Brasil mestiço – sobretudo gêneros musicais de Minas Gerais e do nordeste – também aparecem na discografia áurea da cantora, voz de uma nação em época musicalmente feliz.
Clara Nunes, na imagem cristalizada na memória de quem viveu no Brasil entre 1971 e 1983
Reprodução / Capa de disco

Fonte: G1 Entretenimento